30 abril, 2008



Benditas coisas que eu não sei
Os lugares onde não fui
Os gostos que não provei
Meus verdes ainda não maduros
Os espaços que ainda procuro
Os amores que eu nunca encontrei
Benditas coisas que não sejam benditas

Benditas
Zélia Duncan
Composição: Mart’nália - Zélia Duncan
Imagem: Tela de Luíza Caetano - Ilustre amiga
P É R O L A S

Será
que os diamantes são eternos?
e
as pérolas?
essas
que me deste
em cada dia?
das quais
fiz o colar
que
enfeita meu coração?
Prefiro as pérolas
aos diamantes.
Estes,
já todos os amantes
trocaram.
Me alimento de pérolas
únicas!
brilhantes!
plenas de Luz!
Habito-me
em cada uma!
escavo a mina...
e sempre encontro
Luz lá ao fundo
Pérola - a - pérola...
Tenho o mais belo
colar do mundo!

*Luiza caetano*

29 abril, 2008

"ALMAS GÉMEAS"

Tal qual dois espíritos
se encontram e se perdem
na volatidade dos dias,

Dois espíritos
necessitados
do oxigénio do sonho
para reinventarem a vida,

Dois rios
que se encontram
na confluência dos mares
explodindo as marés,

Dois rios,
duas estrelas
ou dois vulcões

que se cruzam
se abraçam
ou se anulam

lutando contra
o inexorável limite
dos limites.

LuizaCaetano


...Não sei se tem sentido dizer que De braços abertos é a tua melhor peça. ...Há um grande gesto de bondade sua, de compreensão, se derramando sobre todas as personagens. Aí me lembra John Fante, do Pergunte ao pó, que foi o único livro que me fez chorar nos últimos anos. Como a tua peça também me fez. Chorar de compreensão meio estúpida pela perdição humana, pela nossa fragmentação, pelas nossas tentativas freqüentemente tão inábeis, mas tão sinceras também, de “acertar”, de fazer as coisas “do melhor jeito”.
... Porque chega uma hora em que você tem que escolher a vida. Vou falar o óbvio de Eros e Thanatos, mas o impulso para amar, para encontrar e conhecer e mergulhar no outro, é o que nos traz para perto da vida. E é por isso que quando se está de braços abertos, se está dando as costas para a morte.


- De Caio F a Maria Adelaide Amaral -




28 abril, 2008



Somos as palavras que moram dentro de nós.

E a gente ama é aquela pessoa que tem o

poder de acordar as palavras bonitas,

desaprendidas, e que moram em algum lugar

escuro, esquecido, do nosso ser...

O corpo é uma carne possuída pelas palavras

que moram nele. E não adianta o rosto ser

bonito se as palavras que moram lá dentro

são feias. A beleza mora é nas palavras.


______Rubem Alves_______

*Verdade*

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

- Carlos Drummond de Andrade -
Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.

___________________Chico Buarque*

26 abril, 2008


Ausência*

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
(com o pensamento em Ana Cristina Cesar)

- Carlos Drummond de Andrade -

24 abril, 2008


"Aprendemos a amar não quando encontramos a pessoa perfeita, mas quando aprendemos a ver perfeitamente uma pessoa imperfeita."

Queres-me?

Dou-me partido aos teus desejos
e sou parte de mim em teus inteiros
e a força de um sentimento

tens apenas dele um meio

e mesmo assim sempre a faltar-te

a graça plena.


É-me simpática essa tua antipatia
porque não vem ela de ti mas de tuas desalegrias porque ainda não me amas como devias.
E por fim dou-me todo a ti sem querer mais que te falte do beijo ao meu abraço, do olhar à minha palavra, do miolo de mim à alma.

Paulino Vergetti Neto
Publicado no Recanto das Letras em 24/04/2008
Código do texto: T959510

22 abril, 2008

* Sobre Amizade*

“Que qualidade primeira a gente deve esperar de alguém com quem pretende um relacionamento?” Perguntou o jovem jornalista, e respondi: “Aquela que se esperaria do melhor amigo.”

O resto, é claro, seriam os ingredientes da paixão, que vão além da amizade. Mas a base estaria ali: na confiança, na alegria de estar junto, no respeito, na admiração. Em não poder imaginar a vida sem aquela pessoa.

Pode ser um bom critério. Não digo de escolha – pois amor é instinto e intuição – mas uma dessas opções mais profundas, arcaicas, que a gente faz até mesmo sem saber, pra crescer ou para se destruir.

Eu não queria como parceiro de vida quem não pudesse querer como amigo. E amigos fazem parte de meus alicerces emocionais: São um dos ganhos que a passagem do tempo me concedeu.

Falo daquela pessoa que posso telefonar não importa onde ela esteja, nem a hora do dia ou da madrugada, e dizer: “Estou mal, preciso de você.” E ele ou ela estará comigo, pegando um carro, um avião, correndo alguns quarteirões a pé, ou simplesmente ficando ao telefone o tempo necessário para que eu me recupere, me reencontre, me reaprume, não me mate, seja lá o que for.

Falo daquelas amizades para as quais eu sou apenas uma pessoa com manias e brincadeiras, eventuais tristezas, erros e acertos, os anos de chumbo e uma generosa parte de ganhos nesta vida.

Com uma dessas amizades posso fazer graça ou fazer fiasco, chorar, eventualmente dizer palavrão quando me irrito ou quando esmago o dedo na porta. (ou sempre que me der vontade, aliás).

Amizade é meio amor, sem algumas das vantagens dele mas sem o ônus do ciúme – o que é, cá entre nós, uma bela vantagem.

Ser amigo é rir junto, é dar ombro pra chorar, é poder criticar (com carinho, por favor), é poder apresentar o namorado ou namorada, é poder aparecer de chinelo de dedo ou roupão, é poder até brigar e voltar um minuto depois, sem ter que dar explicação nenhuma.

Amiga é aquela a quem se pode ligar quando a gente ta com febre e não quer sair pra pegar as crianças na chuva: a amiga vai e pega junto com as dela, e até nem tem criança naquele colégio.

Amigo é aquele a quem a gente recorre quando se angustia demais, e ele chega confortando, chamando de “minha gatona” mesmo que a gente esteja um trapo.

Amigo, amiga, é um dom incrível, isso eu soube desde cedo, e não viveria sem eles.

Com eles, sem grandes conversas, nem palavras explicitas, aprendi solidariedade, simplicidade, honestidade e carinho.

Sem razão especial ou data marcada, estou homenageando aqueles, aquelas, que têm estado comigo seja como for, para o que der e vier, mesmo quando estou cansada, estou burra, estou irritada ou desatinada – pois às vezes eu sou tudo isso, ah sim.

É bom mesmo é que na amizade, se verdadeira, a gente não precisa se sacrificar, nem compreender, nem perdoar, nem fazer malabarismo sexuais, nem inventar desculpas, nem esconder rugas ou tristezas. A gente pode simplesmente ser: que alívio, neste mundo complicado e desanimador, deslumbrante e terrível, fantástico e cansativo.

Pois o verdadeiro amigo é confiável e estimulante, engraçado e grave, às vezes irritante; pode se afastar, mas sabemos que retorna; ele nos agüenta e nos chama, nos dá impulso e abrigo, e nos faz ser melhores: como o verdadeiro amor.

Lya Luft - Em outras palavras*


10 abril, 2008


Desconheço algo mais perfeito que o beijo. Também não sei de nada mais complexo. Qual medida determina a distância entre a troca de olhares e o primeiro beijo? A retenção do instinto pura e simplesmente, sendo racionalidade cautelar? Preconceitos instalados no eu mais clerical e ortodoxo? No entanto, o tal ato sem precedentes e não arquitetado perderia, quase que de todo, vigor e fundamento.
O beijo é uma mentira que ousa se fazer verdade. Uma repetição simples como o ato de comer e arriscada como a caça do alimento. O beijo é também fermento que se deve saber a medida exata para o confeito. Pois se feito sem feitio pode estragar a massa.
Apesar disso, beijo é medida, mas é sem receita. Porque a mão, melhor, a boca é ato inconfessável como todo pecado deve ser. Algo que se ousa e se usa. Mesmo os mais tímidos já beijaram e, a partir destes, nem pense pensar o que pensaram. Dentro da boca há o céu. Disto sabe-se. Mas a delicia do seu inferno é que nos leva a paraíso prometido. Cartão de visita? Não. Já é cama feita para o camafeu. Não se deixou de ir se não se foi até o fim. O que pode, no máximo, ocorrer é o desgosto. O muito gosto também pode nos fazer recuar, até fugir de medo. Medo de não mais pertencer a si mesmo. Medo do retorno dolorido ou improvável ou da própria viagem rumo ao desconhecido.

Aluisio

Quem gostou da Ideia