27 fevereiro, 2012

Criança diz cada uma...




Sinto inveja da desconcertante criatividade das crianças que, sem cabecismos concretistas ou ambições pseudo-literárias, de repente criam do nada sacadas poéticas como esta: – A cor do céu depende da hora, do tempo e de quem olha. Quem diz que o céu é azul, nem desconfia que, de noite, ele pode ser preto e, quando vai anoitecendo, pode até ser rosa ou vermelho. Quem diz que o céu é azul é analfabeto de céu.

Adultos são o que as crianças se tornam depois que começam a produzir hormônios e a largar sonhos pelo caminho. E é assim que nos tornamos maduros, responsáveis e burrocráticos. Não é de se estranhar, pois, o sucesso da coluna que o dramaturgo e pediatra Pedro Bloch publicava toda semana na revista Manchete, intitulada “Criança Diz Cada Uma”. Nela, Bloch narrava tiradas espontâneas e engraçadíssimas, protagonizadas pelas crianças (de 3 a 11 anos de idade) que passavam pelo seu consultório (como a fala sobre a cor do céu do parágrafo acima).

Olhem só no que deu:

ADULTO – É uma pessoa que sabe tudo, mas quando não sabe diz logo: “veja na enciclopédia”.

ALEGRIA – É um palhacinho no coração da gente.

AMAR – É pensar no outro, mesmo quando a gente nem tá pensando.

BOCA – É a garagem da língua.

BONITA – “Se eu sou bonita ou inteligente? Se eu sou bonita, você vê na cara. E se eu sou inteligente, nem respondo a uma pergunta boba dessas”.

CABELO – É uma coisa que serve pra gente não ficar careca.

CALCANHAR – É o queixo do pé.

CHOCOLATE – É uma coisa que a gente nunca oferece aos amigos porque eles aceitam.

COBRA – É um bicho que só tem rabo.

CRIANÇA – Ser criança é não estragar a vida.

DEUS – Um dia eu disse que Deus era muito distraído e todo mundo riu. Só não sei a graça que isso tem.

ELÉTRONS – São os micróbios da eletricidade.

ESPERANÇA – É um pedaço da gente que sabe que vai dar certo.

FÉ – É uma menininha, na praia, esvaziando o mar com um baldezinho de plástico furado.

FUTEBOL – É um jogo em que, às vezes, a trave joga melhor que o goleiro. Pega tudo.

FUTURO – É tudo que vem depois e, quando chega, já era.

INFERNO – É um lugar onde a gente morre muito mais.

MENTIRA – (ouve-se o estraçalhar de um vidro no banheiro e o menino grita) – “É mentira do barulho!”

MISTÉRIO – É uma coisa que a gente não sabe explicar direito e, quando explica, já não é.

NAMORADO – É uma pessoa que tem medo do claro.

NEVOEIRO – É poeira do frio.

PACIÊNCIA – É uma coisa que mamãe perde sempre.

PIADA – É uma coisa engraçada que perde a graça quando a pessoa avisa que vai ser.

POLUIÇÃO – É sujeira do progresso.

REDE – É uma porção de buracos amarrados com barbante.

REFLEXO – É quando a água do lago se veste de árvores.

RELÂMPAGO – É um barulho rabiscando o céu.

SAUDADE – É quando uma pessoa que devia estar perto está longe.

SONO – É saudade de dormir.

SORTE – É a gente acordar, se preparar pra ir pra escola e descobrir que é feriado nacional.

STRIP-TEASE – É mulher tirando a roupa toda, na frente de todo mundo, sem ser pra tomar banho.

TRISTEZA – É uma criança com gesso no pé, sem assinatura.

VEIAS – São raízes que aparecem no pescoço das meninas que gritam.

VIDA – A vida de muita gente é só gol contra.

VIDA – A vida a gente não explica. Vive.

XINGAR – Quando eu xingo a minha avó, só xingo a metade que é do meu irmão.






Extraído do Blog 
Pensar Enlouquece


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