
"Não existem vários tipos de amor, assim como não
existem três tipos de saudades, quatro de ódio, seis espécies de inveja. O amor
é único, como qualquer sentimento, seja ele destinado a familiares, ao cônjuge
ou a Deus. A diferença é que, como entre marido e mulher não há laços de
sangue, a sedução tem que ser ininterrupta. Por não haver nenhuma garantia de
durabilidade, qualquer alteração no tom de voz nos fragiliza, e de cobrança em
cobrança acabamos por sepultar uma relação que poderia ser eterna.
Casaram. Te amo prá lá, te amo prá cá. Lindo, mas
insustentável. O sucesso de um casamento exige mais do que declarações
românticas. Entre duas pessoas que resolvem dividir o mesmo teto, tem que haver
muito mais do que amor, e às vezes nem necessita de um amor tão intenso. É
preciso que haja, antes de mais nada, respeito. Agressões zero. Disposição para
ouvir argumentos alheios. Alguma paciência.
Amor, só, não basta. Não pode haver competição. Nem comparações.
Tem que ter jogo de cintura para acatar regras que não foram
previamente combinadas. Tem que haver bom humor para enfrentar imprevistos,
acessos de carência, infantilidades. Tem que saber levar.
Amar, só, é pouco. Tem que haver inteligência. Um cérebro
programado para enfrentar tensões pré-menstruais, rejeições, demissões
inesperadas, contas pra pagar. Tem que ter disciplina para educar filhos,dar
exemplo, não gritar. Tem que ter um bom psiquiatra. Não adianta, apenas, amar.
Entre casais que se unem visando a longevidade do matrimônio
tem que haver um pouco de silêncio, amigos de infância, vida própria, um tempo
pra cada um. Tem que haver confiança. Uma certa camaradagem, às vezes fingir
que não viu, fazer de conta que não escutou. É preciso entender que união não
significa, necessariamente, fusão. E que amar, “solamente”, não basta.
Entre homens e mulheres que acham que o amor é só poesia,
tem que haver discernimento, pé no chão, racionalidade. Tem que saber que o
amor pode ser bom, pode durar para sempre, mas que sozinho não dá conta do
recado.
O amor é grande mas não é dois. É preciso convocar uma turma
de sentimentos para amparar esse amor que carrega o ônus da onipotência. O amor
até pode nos bastar, mas ele próprio não se basta.
Um bom Amor aos que já têm!
Um bom encontro aos que procuram!
E felicidades a todos nós!"
(Martha Medeiros - Trem-bala)